Estamos mais próximos de conseguir diagnosticar o autismo, pelo menos uma parte dos casos. Um consórcio internacional com participação portuguesa descobriu mutações associadas a genes raros que são mais frequentes em crianças com esta doença.
O estudo foi publicado na revista Nature e é um passo  importante para o desenvolvimento de um teste que, pela primeira vez,  utiliza a informação genética para detectar um problema que afecta uma  em mil crianças portuguesas.
“Este estudo deu-nos um panorama  muito mais detalhado do genoma destas crianças autistas”, explicou ao  PÚBLICO por telefone Astrid Vicente. A investigadora portuguesa é líder  de um grupo de investigação no Instituto Ricardo Jorge e faz parte do  consórcio constituído por 120 cientistas em 11 países chamado Projecto  do Genoma do Autismo (AGP, em inglês) e a trabalhar desde 2002.
As  novas técnicas moleculares permitiram obter uma resolução do genoma  muito maior. O grupo analisou o ADN de 1000 indivíduos com autismo e  comparou-o com 1300 indivíduos sãos. “Existem muitos fragmentos  genéticos que correspondem a alterações dos genes que ou estão ausentes  ou replicados em grande quantidade”, explica a investigadora. Estas  mutações podem abranger entre um e 20 genes e ocorrem normalmente na  população, mas são 20 por cento mais frequentes nos autistas.
“As  mutações incluem genes expressos no sistema nervoso, alguns  já se  conheciam e estavam associados ao autismo e à deficiência mental”,  continua a investigadora.
Normalmente cada autista tem mais do  que uma mutação. A razão para que uma pessoa com algumas mutações seja  normal e outra desenvolva os distúrbios que caracterizam a doença - um  défice de socialização e comunicação, e comportamentos repetitivos -  depende do contexto genético e ainda vai levar tempo a compreender.
“O  mais importante é que ficámos com uma panóplia de alterações, em que  cada uma é rara mas que no conjunto são responsáveis por uma percentagem  elevada de crianças com autismo”, disse Astrid Vicente.
Há  ainda uma quantidade significativa de doentes em que não se identificou a  causa genética. No entanto com o que já se conhece vai ser possível  produzir um diagnóstico molecular que detecte mais cedo as crianças  autistas ou diga as probabilidades que um casal tem de ter filhos  autistas. O que poderá fazer a diferença em famílias onde já existe a  doença. “Daqui a cinco anos poderão estar disponíveis diagnósticos, há  que recolher mais informação”, salienta a investigadora.
A  produção de medicamentos está mais distante. Os genes mutados dão origem  a proteínas importantes na fisiologia do sistema nervoso. Estas  proteínas podem estar interligadas e apontarem as principais vias  celulares que causam a doença.
“Se identificarmos estas vias  fisiológicas elas vão ser alvo do desenvolvimento de terapêuticas  farmacológicas”, refere a investigadora. A partir daqui, mesmo não  sabendo todas as causas genéticas, haverá medicamentos que poderão  ajudar os autistas.